quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

E tu, também tens medos?!

Hoje combinamos dançar. Desde segunda feira que esta atividade estava decidida, no entanto, a música que acompanharia a dança era uma surpresa para todo o grupo de crianças. Só eu a conhecia. E eles sabiam-no. Sabiam que era uma surpresa que eu lhes estava a preparar e que iríamos dançar, mas não conheciam a música.

Hoje combinamos dançar. Por isso, logo a seguir ao lanche, dirigimo-nos à nossa sala e estava tudo preparado para que pudessemos dançar: lenços espalhados pelo chão e música pronta para ser tocada.

Hoje combinamos dançar, mas assim que a música começou a tocar, os corpos que, até então, se revestiam de energia e pulavam pela sala, pararam estáticos e encolheram-se em si próprios. Olhavam-me, como quem procura o conforto. Havia algumas crianças mais seguras e confiantes e, ao aperceberem-se destes receios, tentaram sossegá-los dando as suas mãos aos que estavam mais assustados. "Dá-me a tua mão. Tu tens medo.", diziam. "Eu estou aqui para ti e vou-te proteger", era o que esta mensagem trazia subjacente. Parei a música e disse-lhes "não podemos mesmo continuar a dançar. Há quem esteja com muito medo. Temos mesmo que respeitar isso!". Pediram-me que tentassemos uma vez mais. Acedi. Tentamos. O medo voltou. Paramos. Compreendemos sentimentos. Encontramos possíveis soluções. Percebemos que, nem sempre, essa soluções são suficientes. Ficamos frustrados, porque queríamos muito dançar, mas não conseguimos. Tentamos superar os nossos medos e percebemos que nem sempre o conseguimos fazer. Seguimos com um novo acordo: que amanhã dançaremos com uma outra música.

Hoje combinamos dançar, mas não dançamos, porque todos temos direito a ter medos! Amanhã será um novo dia e talvez encontremos um novo medo ...

Hospital dos bonecos

O Carlo, pai da Mi., é médico e, na nossa sala, inúmeras são as situações em que nos disfarçamos de médicos e consultamos os nossos bebés e, até, os nossos parceiros de aventuras.

Em conversa com a família da Mi. percebemos que poderia ser verdadeiramente interessante trazermos o hospital até à nossa sala e recriarmos os diferentes passos de uma passagem pelas urgências. Por isso, na passada quarta feira, trouxemos das nossas casas o nosso boneco favorito para a nossa sala e entramos com ele numa divertida visita pelo Hospital dos Bonecos.

Começamos por aguardar a nossa vez na sala de espera do hospital e, aqui, aproveitamos para pôr a conversa em dia e, claro, para brincar um pouco com os nossos bebés.


Assim que fomos chamados pela enfermeira Drica, que estava na triagem, dissemos o nome do nosso bebé e o motivo pelo qual estávamos ali presentes.

"É o Jorge. Partiu o braço a jogar futebol." (Man.)
"É a Milu. Dói-lhe a barriga, porque comeu muito chocolate." (Ar.)
"A Catarina. [Tem] febre." (Raq.)


Seguimos, logo depois, para a consulta com o Dr. Carlo, que, apoiado pelas enfermeiras Em. e Mi., consultaram cada um dos nossos bebés e até lhes fizeram os curativos necessários (e os nada necessários, mas muito apetecíveis).


Para aqueles bebés que tinham fraturas maiores, o Dr. Carlo aconselhou-nos a fazer um raio x e, por isso, com a ajuda da enfermeira Em. deitamos os nossos filho dentro de uma caixa que dava luz e vimos o que é que poderia estar fraturado.


Para terminar, levamos os nossos bebés à sala da medicação, na qual lhes demos todos os medicamentos necessários (ou não!).


Exploradas todas as salas deste hospital dos bonecos, cada um de nós elegeu a sua preferida, permanecendo nela durante um período de tempo mais alargado; formulando um conjunto de questões sobre o que é que nela encontrava; aprofundando as suas habilidades na concretização das tarefas inerentes a cada uma destas salas.


"Ao exercitarem sua autonomia, expressarem seus pontos de vista e negociarem a estruturação dos seus mundos de vida, as crianças viabilizam sua capacidade e interesse em participar" (Agostinho, 2014, p.1137). 

Ao participarem ao seu ritmo e ao escolherem a sala em que pretendiam permanecer durante um período de tempo mais alargado, as crianças exerceram o seu direito de participação. Exploraram, descobriram, brincaram, escolheram, participaram. Foram verdadeiros sujeitos de direitos! De facto, "para as crianças, os direitos são específicos, são experiências e experimentações" (Agostinho, 2014, p.1135). 
Obrigada Carlo e Em. por este hospital tão bom!

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Uma cadela na nossa sala?!

Há muito que os diálogos na nossa sala nos levam até aos nossos animais de estimação. Há muito, também, que estes diálogos nos ajudam a revelar alguns dos nossos maiores medos e a tentar encontrar soluções para os mesmos. Há muito, também, que a vontade de recebermos os nossos animais de estimação na nossa sala é muita e a primeira experiência foi a de sermos visitados pela Paris Hilton, a cadela da Drica.


Antes de a Paris entrar na nossa sala, a Drica recordou-nos do quão importante era que não gritassemos, nem saltassemos, pois poderíamos assustar a Paris. E claro que nós cumprimos este pedido da Drica.


A Drica explicou-nos, também, que tinha comprado biscoitos para a Paris comer e que nós lhe poderíamos dar, sendo que, para isso, bastava que esticassemos a nossa mão. Claro está que, assim que a Paris entrou na nossa sala, logo a quisemos alimentar. Houve, até, quem se apropriasse da caixa só para si e que distribuísse os biscoitos pelas restantes crianças, para que as mesmas pudessem alimentar a Paris. É que, afinal, a Mi. tem mesmo medo de cães e, por isso, a sua participação foi a de distribuidora destes biscoitos. E que boa participação esta!


Da sua casa, a Drica trouxe, ainda, duas escovas, que nós pudemos usar para escovar a Paris. Houve, claro, contudo, quem optasse por só lhe fazer festinhas e por a acariciar. Escovar parecia ser uma tarefa muito árdua.



Com a Paris na nossa sala, alguns receios tornaram-se evidentes e outros foram sendo, progressivamente, superados. Houve quem nunca saísse do colo confortante do audlto. Houve, também, quem iniciasse esta atividade no canto oposto da sala e, progressivamente, se fosse aproximando: primeiramente, apenas para dizer "olá, cadela!" e, de seguida, para a acariciar e, até, para a alimentar. Houve quem nunca saísse de perto da Paris e com a mesma interagisse como se fossem amigas de longa data. Nesta manhã, houve espaço para tudo, mas houve, sobretudo, tempo para nos construirmos como grupo e para nos respeitarmos como pessoas. Pessoas que têm medos, que têm receios, mas que não desistem de se superar.


Obrigada Paris por esta visita.
Obrigada Drica por este momento tão bom!

Famílias, venham daí!

Na nossa sala as famílias entram diariamente. Entram para conversar, para observar as produções culturais que vamos construindo, para nos brindarem com uma partilha ou com uma nova atividade, para nos desafiarem em novos projetos e para nos ajudarem a construir novas aprendizagens. Entram, muitas vezes, sem contarmos, mas entram, sempre, de coração cheio. Acima de tudo, entram e deixam-nos com marcas positivas nas nossas aprendizagens e nos nossos corações. E é precisamente assim que queremos continuar.

A Ana, mãe do P., partilhou comigo, através do email, algumas fotografias do P. a cozinhar bolachas. Neste email contou-me, também, o interesse que o P. nutria por esta atividade e a desenvoltura crescente que, na confeção destas bolachas, lhe observava. Na reunião da manhã do dia seguinte, o P., com a minha ajuda, partilhou com o grupo este seu interesse e contagiou-nos com a vontade de, também nós, confecionarmos estas bolachas. Convidamos, por isso, a Ana para nos ajudar neste momento de cultura alimentar.

Com um saco cheio de ingredientes e de materiais que iríamos necessitar, recebemos de braços abertos, alguns dias depois, a Ana na nossa sala para fazermos, então, estas bolachas. De mangas arregaçadas e de sorrisos no rosto, pusemos as mãos na massa, demos uso ao rolo da cozinha e ao papel vegetal. Exploramos as formas e usamo-las para confecionar as nossas bolachas.

Ao lanche, e depois de as levarmos a cozer no forno, provamos as bolachas e partilhamo-las com a sala da Marta B. E que boas que estavam!



No fim, para lá desta nova experiência de degustação, ficaram os sorrisos e as gargalhadas; a cooperação e as parcerias; o orgulho e a alegria.
Obrigada Ana por este momento tão bom!

A Natacha, mãe da L., chegou um pouco mais cedo à nossa escola. No entanto, claro que a L. ainda não se queria ir embora. Era tarde de dança e a L. não queria perder este momento. Em conversa com a Natacha, perguntei-lhe, então, se não queria vir dançar connosco e ensinar-nos, até, uma nova dança. E a Natacha que não é de recusar os desafios por nós propostos, rapidamente aceitou este. E porque uma dança nunca vem só, a Natacha ensinou-nos duas danças e, ainda, as canções que as acompanham.


No fim, para lá desta nova experiência dançante, ficaram os movimentos e as superações; os sorrisos e as gargalhadas; o orgulho e a alegria.
Obrigada Natacha por este momento tão bom!


"O jardim infantil é para as crianças que o frequentam, para os seus pais [e] para os educadores." 
(Correia, s.d., citado por Homem, 2002, p.40)

Referências bibliográficas:
Homem, M. (2002). O jardim de infância e a família: As fronteiras da cooperação. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Entre reis e rainhas, príncipes e princesas

Na reunião da manhã, o P. partilhou connosco um dos seus bonecos da playmobil. Desta vez, brindava-nos com um rei. Como conversa puxa conversa e partilha puxa partilha, envolvemo-nos num verdadeiro diálogo de confronto cognitivo.

"Os reis e as rainhas usam coroas", sabia-se.
"Eles moram nos castelos."
"Não, não, é nos palácios", debatia-se.
"Mas o que é que os reis fazem?"
"E de quem é que eles são amigos?", perguntava-se.

Entre certezas e inquietações, interesses e curiosidades decidimos, então, envolvermo-nos num novo projeto. Um projeto que nos ajudasse a responder a todas as nossas questões.

Paralelamente, na sala da Mariana, a L.S. partilhou com o grupo duas marionetas que o seu avô lhe tinha oferecido: uma era um rei e outra era uma rainha. Em conversa, a Mariana partilhou com todo o grupo que, na nossa sala, íamos iniciar este projeto e desafiou a L.S. a emprestar-nos estas marionetas. Ao tomarem conhecimento deste projeto, a L.S., a M.S. e a M.B. vieram à nossa sala, dizendo:

"Olha, escreve aí [no diário] que nós também queremos participar no projeto dos reis!"

Proposta lançada é, para nós, sinónimo de desafio aceite e, por isso, todos juntos demos início a este projeto.

Entre idas à biblioteca, pesquisas nos livros e diálogos sobre as informações que iam sendo recolhidas, as aprendizagens foram-se construindo.

A L.S., a M.S. e a M.B. foram sendo, sempre, um apoio para o nosso grupo, porque tendo já mais experiência na realização de projetos, foram partilhando connosco também algumas das suas experiências. Principalmente, nos momentos de brincadeira que sempre se seguiam aos da realização do projeto!


A Joana, mãe da M., teve, também, um papel fundamental em todo este processo. De mão dada com a M. e de saco cheio de surpresas presenteou-nos com escudos de cavaleiros (que havíamos já descoberto que são amigos dos reis) e com coroas que pudemos decorar. Trazia, também, brilhantes que nos ajudaram a fazer coroas quase tão parecidas às dos reis de verdade. Com a ajuda da Joana concretizamos uma das nossas vontades para este projeto - construir coroas e escudos -, mas, sobretudo, recordamos a importância e a maravilha que é termos as nossas famílias na nossa sala.
Obrigada Joana por esta visita tão boa!


Passo a passo fomos construindo o nosso projeto e vivendo todo o processo. Por isso, ao terminá-lo claro que o quisemos partilhar e, desta vez, escolhemos o restante grupo da sala da Mariana e a sala da Mónica para nos acompanharem na fase final, a da comunicação do nosso projeto. Recebemos elogios e sugestões de melhoria. Fomos parabenizados e sentimo-nos valorizados. Crescemos e aprendemos.


Ao terminarmos este projeto, diversas são as aprendizagens que levamos connosco sobre reis e rainhas, príncipes e princesas. No entanto, levamos, sobretudo, um saco cheio de relações sociais, de confrontos cognitivos e de superações pessoais.

Ao envolverem-se na concretização de um projeto, as crianças participam ativamente na construção dos seus próprios conhecimentos de forma concreta e em interação com os seus pares e com o adulto que o apoia. Deste modo, o grupo vai construindo, em cooperação, o seu saber. Por esse motivo, na nossa sala entendemos os projetos como uma estratégia ótima para a construção cooperada de aprendizagens. De facto, "é assim que avançamos no conhecimento, a partir do conhecimento anterior, do já vivenciado ou das práticas passadas e através das pausas críticas (Habermas, 1987), tomadas de consciência, metacognição ou avaliação (Niza, 1997)" (Mendes, 2005, p.7).

Referências bibliográficas:

Mendes, L. (2005). Avaliação: um processo partilhado. Escola Moderna, 24, 5-13.