quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Das panquecas ao desenvolvimento moral

Os diálogos são recorrentes na nossa sala e apresentam-se, cada vez mais, como momentos privilegiados para a construção ética e moral de cada um de nós. O lanche de hoje, que é sempre um momento rico em diálogos e interações, fez-se pautar por um momento de reflexão e de crescimento conjunto.

Na semana passada fizemos panquecas. Porém, o P. saiu mais cedo e não as provou.

"Carolina, podemos fazer panquecas outra vez, porque eu não comi?!", pergunta-me.
"Eu não sei. Eu acho que podes perguntar isto a todo o grupo e vemos, então, o que é que todos nos dizem", respondo-lhe e apoio-o, de seguida, a captar a atenção do grupo.

"Podemos fazer as panquecas outra vez?", pergunta P. a todo o grupo.
"Não!", respondem M. e J.
"Porque é que acham que não?", pergunto-lhes.
"Porque eu não gosto de cenouras", responde J.
"Mas as panquecas não levam cenouras", digo-lhe enquanto lhe mostro a receita que seguimos.
"Mas eu não quero!", continua J.
"Nem eu!", apoia M.
"Então, vamos lá pôr-nos no lugar do P. Vamos lá imaginar que, por exemplo, tu, J., não tinhas vindo à escola no dia em que fizemos panquecas. Tu não gostavas que nós as voltassemos a fazer para tu provares?", desafio.
"Não, porque eu não gosto muito de panquecas", justifica J.
"Então e tu, M., não gostavas?", continuo.
"Sim", responde-me M.
"Então, como é que ficamos? Acham que repetimos as panquecas? O P. tem esse direito!", questiono.
"Sim!", respondem todos, incluindo J.

O pensamento de cada um de nós, a consciência sobre nós próprios e sobre os outros, bem como o desenvolvimento moral de cada um são, gradualmente, construídos com diálogos como este. Diálogos que surgem de interações genuínas, que promovem a nossa reflexão e que desafiam as nossas próprias certezas. De facto, é este processo de "racionalização dos comportamentos que faz com que as crianças se transformem, formando-se umas às outras" (Serralha, 2007, p.180). É neste clima de ambiente democrático que os princípios humanos de cada um se constroem e se revestem de significado.

A moralidade é, de facto, um processo que se constrói em cooperação e em negociação.

Referência bibliográfica:

Serralha, F. (2007). Conselho de Cooperação Educativa. In A Socialização Democrática na Escola: o desenvolvimento sociomoral dos alunos do 1ºCEB (pp.179-188). Tese de Doutoramento. Universidade Católica Portuguesa: Lisboa.

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